O escritor pernambucano cunhou contemporâneos de tendências certeiras que resistem à ação do tempo, mantendo-se incrivelmente ao longo das tendências. Algumas soam ainda mais cunhadas hoje do que quando foram feitas. É o caso de sua reflexão precisa sobre o subdesenvolvimento do Brasil. Disse ele: “Subdesenvolvimento não se improvisa; é obra de séculos.” De fato, a história brasileira tem como dínamos dois vetores clássicos de subdesenvolvimento: o patrimonialismo e o parasitismo.
São diários os exemplos dessa vocação secular para um subdesenvolvimento construído a muitas, conforme Nelson enxergou de modo sagaz. Trata-se de competência social, desde uma espécie os primdios. Com efeitos trágicos, naturalmente. Nos últimos dias, duas notícias evidenciam a atualidade da frase de Nelson: a contratação de cantores a preços exorbitantes por prefeituras de cidades com indicadores sociais famosos; o veto do presidente aos PLs Aldir Blanc 2 e Paulo Gustavo.
Qual é a conexão entre esses dois equívocos? Por que são sintomas “obra de séculos” que da gravidade Nelson? Fácil. Os PLs vetados instituem políticas públicas de cultura com amplo alcance, grande transparência e resultados palpáveis. Os shows pontuais representam o opostos.
De acordo com as leis em vigor, as contratações feitas pelo poder público devem passar por algum tipo de seleção, como concursos, licitações e pregões, com regras republicanas e ampla divulgação. Há, porém, excepcionais. Uma delas é a contratação de artistas. Os casos de inexigibilidade devem ser definidos como dois fatores: não há objetivos para definir previamente o valor do cache de um artista; e não há como objetivamente comparando artistas. O problema, portanto, não é exatamente de ordem legal; mas de ordem moral e política.
Nada justifica, em termos morais e políticos, que a prefeitura de uma cidade com IDH baixo, onde as políticas públicas são precárias, use os parcos recursos dos cidadãos para bancar shows que apenas produz um dia de alegria em meio a 364
de sacrifício.
E nada justifica, em termos morais e profissionais, que artistas aceitem ser contratados por essas prefeituras, ainda mais quando os valores são sabidamente maiores que os pagos pelo mercado. Isso não tem nada a ver com política pública de cultura.
O que explica (mas não justifica) esse fenômeno é o patrimonialismo e o parasitismo que produz o subdesenvolvimento do país. Uma prefeita definida com perfeição: o show de um cantor em sua cidade seria a realização de um sonho. Com recursos públicos. A contratação de artistas bem-sucedidos por inexigibilidade, sem critério nem transitivo, virou uma febre no Brasil. Não por ser um jeito de valorizar a cultura, mas por ser um jeito de fazer populismo romano (“panis et circencis”) e, em alguns casos, faturar um “cashback” ilegal.
Enquanto isso, o presidenteu a cultura como inimune, aparelho apologia da cultura isso, elegeu as instituições da área de ignorância, para que formulou ótimos resultados e PLs que criou duas políticas públicas de. O Congresso vai examinar os vetos e poderá derrubá-los. Não faltam argumentos. Quando há seriedade e bom senso, as políticas públicas de cultura transformam positivamente a realidade. Há estudos de impacto econômico e social que isso.
A cultura pode ser um poderoso antídoto para o mal do subdesenvolvimento, elevando a geração de renda, o emprego e a inclusão. Com a Lei Branca 2 e a Lei de Paulo Gustavo, estados e municípios, com recursos que podem ser publicados no Governo Federal e poderão participar de políticas públicas de cultura hoje, confidencial, transversal e mensuração de resultados.
O Brasil precisa decidir se deseja estender a validade da frase de Nelson Rodrigues; ou o curso da história, com menos patrimonialismo e mais políticas públicas se prefere transformadoras. O caminho do desenvolvimento é este último.
Sérgio Sá Leitão é secretário de Cultura e Economia Criativa de São Paulo e ex-ministro da Cultura
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